Suicídio: quando a desesperança se instala

Por Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira

O suicídio representa um ato impulsivo e violento. Trata-se de um fenômeno multifatorial que ocorre em todas as regiões do mundo. Portanto, é um fenômeno universal, que acontece desde os primórdios da humanidade. É reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um problema de saúde pública em função de sua magnitude, sua gravidade em potencial e a possibilidade de controle.

O suicídio tem um efeito devastador na vida de muitas pessoas: familiares, amigos, colegas, vizinhos levando muitas vezes, a um processo de luto difícil e prolongado. Afeta pessoas independente do grau de instrução e/ou posição sócio-econômica-cultural. O sofrimento psíquico atinge pessoas criativas, produtivas, sem esperança, famosas, fracassadas, solitárias que, em algum momento da vida concretizaram em atos a derrota do existir. Poderia nomear uma vasta gama de escritores, políticos, cientistas, filósofos e artistas que morreram por suicídio, deixando profundas indagações entre os familiares e as pessoas com as quais conviviam, desencadeando fortes sentimentos.

Por gostar de literatura, não me furto ao desejo de trazer o exemplo da norte-americana Sylvia Plath. Os aspectos autobiográficos presentes em seus escritos apontam para a intersecção entre vida, morte e obra. A autora desvela em sua produção poética dor, sofrimento, impulsos destrutivos que a acompanharam em diferentes momentos de sua vida. Em seus   poemas existe uma poética do suicídio, como observável em um trecho do poema Kidness (Bondade) “o jato de sangue é poesia, não há nada que o detenha”. Outra reveladora passagem encontra-se no poema Edge (Auge) em que expressa de forma explícita, o desejo suicida “A mulher está perfeita. Morto/Seu corpo mostra um sorriso de satisfação […]   “Nus, seus pés/ parecem nos dizer: Fomos tão longe, é o fim.” Sylvia Plath morreu após 10 anos do início de uma trajetória de desespero em que sobrevivera a inúmeras tentativas de suicídio.

Há inúmeros escritores célebres que morreram por suicídio. Destaco entre eles, Virginia Woolf, que morreu por afogamento em 1941 e Florbela Espanca, portuguesa, com morte por intoxicação em 1930. Junta-se ainda, o nome de Ana Cristina César, brasileira que se matou em 1983. A incursão no mundo mágico das letras e da paixão pelas palavras não lhes permitiu   reinventar suas experiências. O fascínio pela poesia e o prazer em escrever não foram suficientes para alimentar o desejo de viver.

Por que o homem se sente atraído pela morte, não suporta o jogo das interações e/ou sucumbe ao peso da dor psíquica, sem querer romper seu silêncio com um pedido de ajuda? Por que algumas pessoas não conseguem sobreviver à dor da perda sem deixar de pensar em pôr fim à própria vida? Por que jovens e adolescentes ao enfrentar os desafios da sociedade não conseguem suportar o peso das exigências que, associados a outros fatores os conduzem à busca da morte? Por que pessoas idosas ao se depararem com a angústia provocada pela solidão, pela exclusão, pelas limitações físicas e mentais elegem a morte como a saída de seu sofrimento?

Responder a tais questionamentos nos lança aos desafios de buscar entender a complexidade da existência, mergulhar nas incertezas do viver, enfrentar o paradoxo vida/morte. A filosofia, a sociologia, a medicina, a psicologia, o direito e tantas outras áreas do conhecimento tentam compreender a explicar as razões porque uma pessoa perde a paixão pela vida. Mas, nenhuma consegue explicar plenamente a morte por suicídio.

Essas reflexões desafiam todos os profissionais que cuidam de pessoas que apresentam comportamento suicida consolidando a necessidade da escuta e do acolhimento do sofrimento intolerável do outro. Identificar os sinais de sofrimento intenso, encaminhar para o cuidado interdisciplinar, fortalecer a rede de apoio, são alguns dos caminhos possíveis para ajudar uma pessoa em risco de suicídio a encontrar ou reconstruir novos sentidos para a vida.


Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira é doutora em Psicologia (UnB), mestre em Educação (UFG), terapeuta Familiar Sistêmica. Psicodramatista. Possui certificação Internacional em Práticas Colaborativas e Dialógicas (Interfaci/Galveston Institute/Taos Institute); curso de aprimoramento no Instituto 4 Estações (SP). Psicoterapeuta em situações de perdas, luto e comportamento suicida. Associada Individual da ABMLuto.

  • Foto de Tara Winstead

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